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terça-feira, julho 06, 2010

Sobre a Chuva


Muitas pessoas detestam a chuva por acreditarem que ela leva em suas águas todas as possibilidades de se aproveitar o dia. Eu, particularmente, gosto dela, pois ela sempre me remete a lembranças doces que guardo em mim. Foi na chuva que corri com minha melhor amiga na esperança de renovar o nosso espirito para aceitar as mudanças que a adolescência nos trazia. Foi em meio a chuva que andei cantando e chorando sozinha quando a dor foi grande e eu tive que mudar, me renovei nas águas deixando a menina e aceitando a mulher que dela nascia. Ainda nela caminhei pela Paulista sozinha após sair da minha primeira entrevista de emprego e do meu primeiro não, olhava as pessoas correndo com seus guarda-chuvas e pensava:
- Por que o medo se isso é apenas água?
Também tive momentos marcantes com os amores que tive na vida: caminhei para renovar um amor conturbado ensinando ao meu parceiro que podiamos ser livres enquanto o mundo se preocupava em correr. Vi a chuva despencar do céu com força no dia em que deixei meu "poeta maldito" sem olhar para trás. Minha amiga liquida me fez companhia também no dia em que disse adeus a um poeta de ego imenso que por um lapso resolveu me amar, pena que eu nunca pude sentir o mesmo também...
Em Curitiba, lugar onde por três dias me senti parte de uma família, senti a chuva chegando e brincando com o rosto do meu filho que se divertia com a chuva caindo em seu pequeno rosto. Alguns anos depois vi em seu rosto não a felicidade antiga, amis o pavor de quem esqueceu da beleza das gotas e guardou em seu coração apenas o barulho do trovão. Espero que um dia esse medo se acabe...
Tantos foram meus momentos na chuva, tão belos e cheio de significados, contudo o que eu vou narrar aconteceu em outra vida, em um lugar comum, teve a duração de um momento que se eternizou, a história começa mais ou menos assim:
Ela, desanimada, voltava do trabalho sentindo que perdia a vida, pois não lutava por nada, não esperava encontrar ou ganhar nada, preocupava-se apenas com o dinheiro que tinha que conseguir para ela e seu filho viverem em paz. Saindo do metrô a chuva começou a cair,ela não tinha medo da chuva, por isso resolveu caminhar sem abrir o guarda-chuva até o ponto de ônibus. Quando ia chegando ao ponto viu seu ônibus indo embora, não queria correr, estava cansada, por isso permaneceu na cobertura sozinha a espera da próxima condução, contudo o que chegou não foi um carro, antes mais uma pessoa perdida num dia frio de chuva. Ele olhou para ela e sorriu, ela retribui, lembrou que já tinha visto o rapaz a alguns dias atrás enquanto voltava para a casa no mesmo ônibus. Começaram a conversar e entre palavras e sorrisos se aproximaram, talvez por frio ou por atração, mais o fato é que ele pediu para pegar em sua mão e a moça sem censurar seus gestos permitiu. Ficaram ali, um segurando na mão do outro enquanto conversavam sobre assuntos banais. O ônibus dos dois finalmente chegou, soltaram as mãos para entrar no carro, já sentados um do lado do outro deram as mãos novamente e permaneceram assim por toda a viagem apenas adimirando suas mãos juntas numa singela troca de intimidade.
Chegado o ponto da moça ela deu sinal, olhou bem nos olhos do rapaz, aproximou-se dele como quem fosse beijar-lhe os lábios, mas acabou por beijar seu rosto, levantou e quando saiu do ônibus não olhou para trás.
Quando entrou em casa, sentiu-se renovada, pois naquele momento fora tocada de maneira singela e pura, naqueles segundos eternos teve um parceiro, um amante, um companheiro que com um simples gesto lhe vez lembrar que o belo da vida é acreditar no poder das pequenas felicidades clandestinas. Ela nunca mais o encontrou mais por toda uma eternidade vai guardar a beleza escondida no simples gesto de oferecer as mãos.

2 comentários:

Bah disse...

Ahhh eu adoro a chuva. Ela lava a alma, purifica os sentimentos. Vem como um tempo feio, que depois que passa, surge a vida, o horizonte, dias melhores...

Kisu!

Khêder Henrique Ribeiro disse...

Eu fiquei realmente emocionado com seu texto. Muito lindo, Let! Saber escrever de verdade é um dom raro. Provocar emoções com as palavras é ainda mais raro. E, moça, sem dúvidas, você detém esse dom. Meus parabéns!